ANCIENT RITES

Ancient Rites logo (1)Nove anos depois do último disco, uma das mais emblemáticas bandas de black metal está de volta às edições. Os belgas Ancient Rites lançam, com «Laguz», o seu sexto disco de estúdio e relembram os fãs que, em termos de black metal sinfónico de inspiração histórica, não há quem os bata. O fundador, mentor e vocalista Gunther Theys explicou-nos o que reteve o projecto na penumbra quase uma década e quais as principais diferenças entre o underground onde os Ancient Rites prosperaram nos anos 90 e a actual indústria musical.

achtercd-collageDemoraram nove anos a editar um novo disco. Porquê?
Existem vários motivos, na verdade. O primeiro de todos foi que alguns dos elementos da banda tiveram outras obrigações a cumprir, depois houveram mudanças na formação e não havia contrato discográfico. No momento em que voltámos a assinar por uma editora, começou tudo a correr numa velocidade normal outra vez. Assinámos o contrato há uns meses, tínhamos a maioria das canções preparadas há vários anos e voltou tudo a andar rapidamente. Por isso foi, em boa verdade, uma combinação de várias circunstâncias.

A composição do disco foi então sendo feita ao longo destes nove anos e não apenas quando assinaram pela Massacre Records?
Exactamente. É provavelmente por isso que alguns jornalistas que me entrevistam e pessoas que falam comigo se mostram surpreendidas; por termos estado totalmente silenciosos durante nove anos e de repente temos tudo cá fora. Mas não, as canções foram sendo compostas ao longo dos anos, em diferentes períodos. No momento em que chegámos a acordo com a Massacre Records, grande parte do material estava pronto. Nada foi feito à pressa.

Tiveram de fazer alguns arranjos finais ou as canções iam saindo, ao longo dos diferentes períodos em que foram compostas, já com a coesão que o disco apresenta?
É sempre um trabalho em progresso. As músicas crescem lentamente, todos os elementos trazem as suas próprias ideias e, depois, no momento em que entramos em estúdio, ainda existe espaço para alterações. E mesmo eu posso ouvir os temas, quando o resultado final está pronto, e ficar surpreendido, porque é aí que todo o puzzle fica completo. É, por isso, um trabalho em progresso mesmo até ao fim.

Não fizeram então um esforço consciente em ter uma abordagem mais evidentemente sinfónica no álbum? Foi algo que surgiu naturalmente quando compuseram as canções?
Exactamente. Não fazemos grandes planos; as coisas saem naturalmente assim e mesmo na pré-produção e nas maquetas que fizemos havia muita orquestração. Porque achamos que o aspecto cinematográfico ajuda o ouvinte a entrar nos mundos que tentamos descrever. É uma ferramenta que ajuda o ouvinte a entrar na atmosfera. Começamos, obviamente, com uma sonoridade muito crua e metálica e depois tentamos alargar o espectro, de modo a que as letras e os universos que descrevemos se abram para o ouvinte e para quem lê as notas no folheto e tudo. Tentamos dar uma visão completa de todas temáticas. Mas é um processo perfeitamente natural.

Ancient Rites 2015Foi uma preocupação vossa respeitar sempre a sonoridade dos Ancient Rites? Porque numa década a vossa evolução musical e pessoal pode ser tão grande, existiram momento em que acharam que se estavam talvez a afastar um pouco demais do que é a personalidade musical da banda e eventualmente recuaram?
O que para mim é o mais importante é que a música se encaixe na essência do que somos. Na minha opinião, desde que começámos a banda até agora, evoluímos imenso musicalmente, mas a essência continua lá. É uma viagem a tempos antigos, a um universo mais negro e são diferentes dialectos musicais que tentamos usar para chegarmos a essa atmosfera. É claro que estou consciente que, para algumas pessoas, evoluímos – ou mudámos – muito, mas em termos de sentimentos, e para mim pessoalmente, o que fizemos nunca foi com base em modas ou nas tendências mais recentes. Foi sempre muito longe de todas essas coisas. E isso é o que me parece mais importante. Mas usamos diferentes elementos musicais; pode ser folk, música medieval ou clássica para nos ajudar a chegar a esse objectivo.

Durante estes nove anos existiu algum período em que sentiste a motivação em baixo? Consideraste a hipótese dos Ancient Rites nunca mais gravarem nada?
Pessoalmente, notei que os tempos estavam a mudar e as coisas estavam mais difíceis. A indústria musical mudou muito e, não sendo contra os downloads nem nada disso, notei que os orçamentos para as bandas underground, ou para as bandas que não pertencem ao mainstream, estavam a ser cortados. A minha ideia sempre foi preferir não lançar álbum nenhum do que fazer uma coisa que não valesse a pena ser lançada, apenas por fazer. Por isso acho que foi uma questão de esperar pelo momento certo e, de repente, esse momento chegou. Fomos de novo contratados, de repente havia um orçamento disponível e a altura tinha chegado. Nunca parámos as actividades da banda nem deixámos de existir, mas foi um período imprevisível. Foi uma espera pelo momento certo de tudo, havia inúmeros factores que eram obstáculos. O aspecto financeiro era um deles, a editora também, as obrigações de alguns elementos da banda… Mas nunca desistimos, nunca vi nenhum destes obstáculos como o final do projecto. Esperava, claro, que as coisas se resolvessem o mais rapidamente possível, mas foi uma longa espera. Isso tenho de admitir.

Isso aconteceu porque tens experiência. Se tivesses vinte e poucos anos, provavelmente a banda teria acabado, certo?
Exactamente. Se as bandas não tiverem este background, que construímos do zero… E, para além disso, somos suficientemente afortunados para termos um público que normalmente não segue modas e sabe que preferimos qualidade à quantidade. Se fossemos uma banda jovem, provavelmente [estas dificuldades] teriam sido o nosso final. Porque quando somos jovens não esperamos anos que algo aconteça, que os calendários se acertem, que os timings se articulem, que encontremos outro acordo discográfico. Para a maioria das bandas jovens todas estas coisas seriam um enorme desapontamento. Mas porque sempre tivemos de lidar com os mais diferentes obstáculos – nunca assinámos com grandes empresas de gestão de carreira – sempre tivemos de fazer tudo sozinhos e isso fez-nos, de certo modo, endurecer a nossa atitude. Deste modo, e neste caso, o tempo esteve do nosso lado, apesar de não ter ajudado. Foram muitos obstáculos a ultrapassar, mas devido à experiência e ao background que temos foi possível sobrevivermos a um período assim.

Ancient Rites Cover 2015«Laguz», o título do disco, refere-se à reconstrução proto-germâmica da runa que significa “água”. O sentido é literal ou significa algo mais?
Sim, esse é um dos significados. É uma runa pouco conhecida. Quando os antigos liam as runas, esta era uma que tinha um lado mais negro e uma certa dualidade. De um ponto de vista representa o início de tudo, a essência, como a água é o início da vida. Mas também representa renovação, iniciação e dificuldades. A runa Laguz também representa uma provação necessária para obtermos a recompensa que nos espera no final. De certa forma é uma coisa muito simbólica, que se encaixa perfeitamente na situação em que a banda se viu envolvida. Tivemos de enfrentar inúmeros obstáculos para sairmos do processo mais fortes. A nível pessoal, tive uns anos complicados no passado, tive de lidar com várias intervenções cirúrgicas e, por isso, é uma runa que simboliza perseverança e resiliência, e representa quem mantém a mente bem focada naquilo que está para além das dificuldades que enfrenta.

Fazes então a ligação, nas letras, para temáticas mais contemporâneas.
Existe uma reflexão pessoal envolvida, sobretudo psicológica mas existe também uma certa abordagem filosófica. Quando vemos as pessoas à nossa volta a desaparecerem, a morrerem e temos de lidar com as nossas situações pessoais, tudo isso tem influência na nossa forma de pensar e escrever. Canções como a «Mind Unconquered» passam também um pouco uma mensagem positiva, tipo quando passamos pelas dificuldades é importante nunca nos irmos abaixo ou sentirmos pena de nós próprios; temos de enfrentar os problemas e lidar com eles. Esquecer a auto-comiseração e fazer o melhor possível em cada situação. Nesse ponto de vista, e logo a seguir ao conceito histórico que temos sempre, reflectimos um pouco sobre o que acontece na nossa vida quotidiana. Tem mais camadas e significados mais profundos.

Trabalhas como assistente social. Achas que essa profissão te dá uma bagagem que carregas para a tua vida pessoal e, conscientemente, para as letras que escreves? Ou essa parte da tua vida fica no emprego e quando chegas a casa és outra pessoa totalmente diferente?
Não, porque nada do que faço é calculado. Acontece tudo de forma natural e tudo o que faço – também faço novelas gráficas, por exemplo – é uma combinação de todos os meus interesses e fascínios… E também do que faço e do que sou. Não procuro o que é popular ou tento corresponder às expectativas. Quando pinto, desenho, faço música ou escrevo letras, essas são expressões daquilo que sinto. E acho que sempre funcionou como um puzzle que se vai montando. Como a faixa «Mind Unconquered» de que falei há pouco, que fala de fazermos o melhor que pudermos com o que temos enquanto estamos cá, ou a «Umbra Sumus (We Are Shadows)», que revela que todos somos sombras que irão desaparecer mais cedo ou mais tarde. Por causa do meu emprego, em que trabalho com pessoas incapacitadas visualmente, acabo por encarar tudo com uma perspectiva mais lata, numa luz diferente. Acho que, o que quer que façamos na vida, acaba por reflectir-se no nosso trabalho… E é assim que deve ser, porque a partir do momento em que fazemos arte ou particularmente música, e tentamos apenas apanhar a moda mais recente, o que é mais popular ou o que as pessoas procuram, perdemos a alma disto tudo. O que tento fazer é simplesmente expressar o que sinto, os meus interesses, a minha vida, e tento partilhar tudo o que faço com quem possa estar interessado. Não interessa muito se é compreendido ou se as pessoas gostam ou não, porque se andasse à procura disso não faria a música que faço. Não teria optado pelo estilo de música que praticamos, porque comercialmente – sejamos realistas – não há qualquer lucro, porque não é para o mainstream. Mas isso não interessa, porque é tudo expressão dos nossos interesses, paixões, hobbies. E é tudo isso que sai.

Gunther-knightComo estás a lidar com este regresso à indústria discográfica nove anos depois? Esta fase de promoção está a ser muito diferente de como era antigamente?
É difícil dizer. Do meu ponto de vista, sinto que a máquina está melhor organizada em todos os aspectos. Temos uma equipa de promoção, com várias pessoas envolvidas a contactar todas as entidades. E depois esta era digital… Como sabes, venho de outro tempo, em que tudo tinha de acontecer através de correio normal. Como no tempo do tape trading, em que tínhamos um álbum em vinil e tínhamos de gravar as nossas próprias cassetes para divulgarmos a música. Trocávamos cassetes com bandas do teu país e de todo o mundo, fazíamos entrevistas, enviávamos flyers… É muito estranho, porque agora parece que venho de uma era pré-histórica ou algo assim. Ao mesmo tempo tinha o seu charme e guardo as melhores memórias desse tempo, porque funcionava… Eu mandava cartas para a Malásia, para a Grécia, para Portugal, recebi cassetes de bandas que nunca chegaram a lado nenhum, mas não importa. Trocávamos t-shirts e chegávamos a todo o lado, mas era uma mentalidade muito Do It Yourself. E para mim é muito estranho ter tudo organizado e a equipa de promoção contactar-me a perguntar se posso falar com este ou aquele meio de comunicação social… Acho fantástico, mas estou principalmente habituado à cena DIY. Por isso, do meu ponto de vista, é tudo um bónus. A indústria musical está mais complicada, mais difícil e estranha mas, por outro lado, uma vez que sempre tivemos de fazer tudo sozinhos, estou habituado ao facto de nada acontecer de forma simples ou fácil. Por isso, é muito difícil ter uma visão clara das mudanças. Sou old school ao ponto de ter falado com um jornalista numa entrevista noutro dia e ele dizer-me “Gosto do vosso álbum” e eu ter perguntado “Como o conheces? Ainda não foram enviados os CDs promocionais nem nada”, porque ainda penso como antigamente. Foi aí que ele me explicou que há um link online onde os jornalistas podem ouvir o álbum e eu disse “Ah, OK. Nunca tinha pensado nisso”. A minha ideia era “Ainda não vi nenhum CD, como é que estes tipos podem conhecer o disco?”. [risos]

Outro aspecto da indústria musical actual é que os discos já não vendem assim tanto e as bandas têm de fazer dinheiro em digressões. Sendo todos vocês pessoas já com uma certa idade e com empregos fixos, planeiam ter uma agenda muito preenchida em termos de concertos?
Se dependesse de mim ia para a estrada a qualquer momento, mas infelizmente tenho de funcionar com a banda. [risos] É verdade que também vejo mudanças aí… Antigamente fazíamos muitas digressões, mas nestes últimos anos aquilo que notei é que há mais festivais e digressões de festivais que estão mais concentradas nos fins-de-semana. E, nos últimos anos em que estivemos activos, quando tocávamos no meio do nada numa quinta-feira à noite, ninguém aparecia e aos fins-de-semana estava sempre tudo cheio. O resto da banda também acha que é melhor focarmo-nos nesses eventos concentrados, de forma a que possamos chegar ao maior número de pessoas possível e combinar isso com os nossos empregos. Porque não somos uma Lady Gaga que pode viver da música; todos temos os nossos empregos e tentamos encontrar um equilíbrio entre todas estas situações. É claro que vamos tocar ao vivo, porque temos propostas para concertos em França, foi-nos proposta uma digressão em Inglaterra, na Holanda e no nosso país. E quem sabe possamos voltar um dia a Portugal… Seria bom, porque vocês têm vinhos e comida excelentes. [risos]

A comida e o vinho são as nossas maiores atracções para as bandas estrangeiras. Às vezes mais do que o próprio cachet.
Como sabes a minha mulher é grega e gostamos de comida do sul da Europa. Costumamos ir a um restaurante português aqui perto da nossa casa e comer alguns pratos tradicionais. O restaurante é gerido por pessoas portuguesas que vivem aqui… Não têm Sagres nem Super Bock mas têm bons vinhos e bons pratos tradicionais.

O que te fascina tanto nos países do sul da Europa?
Muitas coisas. Sou fascinado por todas as terras antigas europeias, mas por exemplo em Portugal aquilo que acho muito importante historicamente é o facto de serem viajantes pelo mundo, exploradores. E acho que ainda há traços disso na cultura, quando visitamos certas cidades daí e vemos os monumentos. É óbvio que, lendo tanto desde a minha infância, fiquei fascinado com o facto, que muita gente parece desconhecer, que a essência dos povos se prolonga na sua forma de ser. Os portugueses sempre exploraram outras terras e é talvez por isso que se espalham tanto por todo o mundo. Vocês viajam mais facilmente do que outros povos – talvez seja uma parte da vossa alma. Isto vai parecer um cliché, falso e que estou apenas a tentar explorar os vossos leitores, mas fui muitas vezes a Portugal e acho as pessoas muito relaxadas e hospitaleiras, gosto da comida e partilho o humor. Para além disso, a história é muito fascinante, o que é um bónus. Por isso gosto sempre de regressar.

E és sempre muito bem vindo aqui.
Obrigado. Não “Obrigada”, mas obrigado, certo?

Certo. Isso mostra o quão bem conheces a língua. É um detalhe com que poucos estrangeiros se preocupam.
Sim, sei que toda a gente de fora diz “Obrigado”, mesmo quando se agradece a uma senhora. Tentei dominar esse detalhe para não ser insultuoso.

Desde que nos agradeçam, regra geral já ficamos contentes.
Sim, sei que é sempre simpático, mas a dada altura pensei “Hmm, seria uma coisa interessante de aprender”. Mas acho o português de Portugal mais difícil de dominar, em termos de linguagem falada, que o português do Brasil. O português falado pelos brasileiros parece uma versão mais fácil da linguagem, mas posso estar errado. Mas talvez seja uma coisa similar à que se passa entre a Inglaterra e a América. O inglês de Inglaterra parece mais complexo e detalhado que o americano. Talvez seja uma cena colonial. [risos]

E é, porque tanto os americanos como os brasileiros tiveram de aprender a linguagem também.
Sim, és bem capaz de ter razão. A versão da linguagem das ex-colónias parece ser uma versão mais directa e simplificada, enquanto que a linguagem-base é mais complexa. É um sentimento que tenho também, apesar de não falar português de todo. Mas nos sons e na pronúncia nota-se bem… O português de Portugal é mais complexo. A tua explicação justifica-o na perfeição.

Se fores a algum sítio, ensinares uma coisa complexa e depois te fores embora, quando voltares alguns anos depois é natural que encontres uma versão bem mais simplificada daquilo que ensinaste.
Sim, é a versão deles da linguagem. E sim, o mesmo se passa com o inglês da América, que teve a sua própria evolução. E, quando voltamos às raízes, percebemos que são muito mais complexas, até na pronúncia. Acho muito interessante esse tipo de coisas e estou sempre a observar esses pormenores em detalhe.

O mesmo se passa com as ex-colónias de Espanha na América do Sul e com as ex-colónias francesas em África. Por vezes, para além de mais simples, a linguagem é muito mais musical.
Sim, é mais musical e parece mais divertida. Se formos à literatura, aos originais das linguagens-mãe – e não quero parecer ofensivo para ninguém – é tudo muito rígido e sério. Mas para aprender, frequentemente é mais fácil aprender a versão da linguagem das ex-colónias, ou dos novos países. É mais simples de perceberemos e de começarmos a falar. É mais divertido.

Da última vez que falámos tinhas sido expropriado do projecto e do nome Danse Macabre. Como viste os eventos seguintes, em que a banda mudou de nome e eventualmente não lança um novo álbum desde 2006? É algo que te afecta ou simplesmente não te importa?
É uma mistura. É uma história antiga que me fez aprender muito. Antigamente era suficientemente inocente para acreditar que quando alguém fundava uma banda tinha direito moral a ficar com ela. Porque, como sabes, fundei o grupo na Grécia com membros dos Rotting Christ, Necromantia e Septicflesh. Mas como eles estavam muito ocupados – o Sotiris [Vayenas, dos Septicflesh] teve de ir para a tropa durante dois anos, o Magus [Wampyr Daoloth, dos Necromantia] estava ocupado com outros projectos – eu pedi-lhes para continuar a banda com o guitarrista dos Ancient Rites da altura, que era um bom compositor e um tipo com talento. Mas existiu um conflito em digressão, as coisas correram mal e na altura em que voltei a casa recebi uma notificação oficial a dizer que o copyright do nome da tinha sido comprado e que, durante os dez anos seguintes, não me era permitido trabalhar nos Danse Macabre. E tínhamos acabado de gravar um álbum que acho que era o melhor que já tínhamos feito, em que havia letras muito pessoais, sobre a morte da minha avó e esse tipo de coisas… Não quero ser muito trágico sobre isso, mas colocamos sempre muito de nós no trabalho e o resultado dessa disputa é que tudo foi apagado, reescrito e relançado como outro nome de banda. Ainda tenho a minha própria cópia do álbum, como era originalmente, e acho que é muito triste, do ponto de vista da criatividade, porque é uma história que nunca foi contada e que foi corrompida pela indústria musical e por um conflito pessoal. Acho muito triste o facto de nunca ninguém ter ouvido esse material, porque faz parte de uma era. Não me importo de ter perdido a batalha, porque aprendi algo no processo – apesar de não ser uma lição muito agradável – que foi o facto da indústria musical ganhar sempre no fim e não importa se somos fundadores de uma banda ou criámos alguma coisa… Se não temos dinheiro, que na altura não tinha, para pagar a advogados para tentar reverter a situação, se não detemos o tal papel, não há nada a fazer. É a vida.

É uma pena que tenhas percebido isso através do teu próprio caso. Existe muita gente que aprende ao ver acontecer a outros.
Aconteceu-me a mim, sim, foi a típica situação pessoal. Por outro lado, este tipo de coisas deixam-nos mais duros… Como disse há pouco, tive também de enfrentar uma série de intervenções cirúrgicas, que fizeram com que andasse a entrar e a sair de hospitais durante alguns anos. Quando temos uma série de obstáculos complicados a ultrapassar, isso torna-nos mais duros e fortes. Quando as dificuldades seguintes aparecem já temos essa capa couraçada, dizemos algo do género “OK, vamos lá a isso”. Foi por isso que, durante todos os anos em que os [Ancient] Rites não tiveram oportunidades eu sempre acreditei que íamos conseguir. E agora, o disco ainda não saiu e já há pessoas a dizer que é uma merda, que o novo vocalista é mau – nem sequer sabem que sou a mesma pessoa de antigamente – e acabei de abrir o Facebook e vi um comentário a dizer “É pena que tenham uma capa tão má no disco”. Vão existir sempre pessoas a falar mal, mas se tivermos enfrentado situações realmente complicadas, encaramos tudo isto numa perspectiva de “Sim, essa é a tua opinião mas esta é a minha visão. Sente o que quiseres mas eu não me importo”. Ficamos com uma espécie de pele de elefante. Por vezes mesmo os meios mais mainstream aqui no nosso país… Houve uma série policial, na qual se usou a nossa música como banda-sonora sempre que havia um crime. Por isso só nos conhecem nesse lado mais negativo, mas que se lixe, que façam o que quiserem. De certa forma, vemos tudo em perspectiva e paramos de nos importarmos. As lições mais duras por vezes são as melhores.

«Laguz» é editado no dia 20 de Fevereiro pela Massacre Records.
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